A perigosa combinação entre álcool e volante é tema de pelo menos 50 projetos de lei que estão em tramitação no Congresso Nacional atualmente. A maioria das propostas tem como objetivo endurecer ainda mais as punições tanto para quem bebe e assume a direção, mesmo que não provoque nenhuma ocorrência, quanto para o motorista que efetivamente causa acidentes porque está embriagado. No Brasil, cerca de 40 mil pessoas morrem no trânsito todos os anos.
A segurança no trânsito é um tema recorrente entre parlamentares. De acordo com a Agência Câmara, já foram apresentadas 500 propostas de alteração do Código de Trânsito Brasileiro. Em 2008, foi aprovada a mudança que ficou conhecida como Lei Seca (lei de número 11.705).
Ela causou polêmica por ser uma das mais rígidas da América e da Europa: a pena para o motorista pego com 6 decigramas de álcool por litro de sangue (o equivalente a dois chopes) é a detenção de seis meses a três anos. Quem bebe um copo pequeno de cerveja ou come dois bombons de licor, por exemplo, pode ser pego no bafômetro e levar multa de R$ 957,70, além de perder a carteira de motorista e ter o carro retido.
No entanto, deputados e senadores querem ainda mais rigor. Um dos projetos que avança no Congresso é do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES). O PL 2788/11, que foi aprovado em dezembro no Senado e chegou à Câmara, prevê tolerância zero ao álcool no volante. A ideia de Ferraço é criminalizar o ato de dirigir sob a influência de qualquer concentração de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência – ainda que o motorista não tenha se envolvido em acidentes.
– Da mesma forma que é crime portar arma, deve ser crime dirigir alcoolizado, pelo risco que isso representa. É necessário endurecer o jogo para ver os indicadores de acidentes e mortes no trânsito se reduzirem.
O senador defende ainda o uso de outras provas para comprovação da embriaguez, além do conhecido teste do bafômetro e do exame de sangue. Poderiam ser feitos exames clínicos, perícia, provas testemunhais, fotos e vídeos. O texto prevê agravantes para os casos de acidentes. Quem provoca a morte de alguém poderia pegar até 16 anos de prisão.
O deputado Hugo Leal (PSC-RJ), que coordena a Frente Parlamentar em Defesa do Trânsito Seguro, diz que o projeto pode ser analisado na Câmara no primeiro trimestre deste ano. No entanto, o texto deve passar por modificações na Comissão de Viação e Transportes.
Leal avalia, por exemplo, que a tolerância ao álcool não pode ser zero, porque deve haver margem de erro de, pelo menos, 0,1 decigramas. Além disso, diz que a punição de 16 anos de prisão é excessiva quando comparada a outras penas criminais.
– A iniciativa dele [senador Ricardo Ferraço] é positiva. É a partir dela que vamos fazer as adequações na Legislação.
O ponto que mais interessa no projeto, explica Leal, é deixar clara a possibilidade de obter outras provas de embriaguez. Como existe o entendimento jurídico de que ninguém pode produzir provas contra si mesmo, muitos motoristas se recusam a fazer o teste do bafômetro.
Prós e contras
O presidente da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes), Paulo Solmucci, vê como abusivas tanto a atual Lei Seca quanto as tentativas de torná-la ainda mais rigorosa.
– As pessoas que bebem em excesso devem ser punidas. Mas um país não pode criminalizar o cidadão responsável que toma uma taça de vinho com a refeição.
Desde que entrou em vigor, a regra é contestada pela entidade no STF (Supremo Tribunal Federal). Neste ano, a Corte deve fazer audiências públicas para discutir o assunto.
Para a Abrasel, a lei tem sido pouco eficaz na redução da violência no trânsito. A associação entende que seria mais eficaz trabalhar com campanhas educativas.
O presidente da Abramet (Associação Brasileira de Medicina de Tráfego), Mauro Augusto Ribeiro, é um defensor da Lei Seca, mas admite que faltam ajustes para que ela funcione melhor. Ele pede mais fiscalização e diz que a violência no trânsito é um problema de saúde pública, que precisa ser combatido em várias frentes.
De acordo com o médico, a lei deve prever tolerância baixa ao álcool, pois as pessoas reagem de formas diferentes a seu consumo. Quem é mais sensível ou não está acostumado com bebida pode ter alterações importantes com apenas um copo de cerveja.
Na opinião de Ribeiro, um dos principais pontos a serem aperfeiçoados na lei é o uso do bafômetro, que deve ser estimulado até como forma de demonstrar que o cidadão não está bêbado. Ele ressalta a importância da norma e lembra que, nos primeiros 30 dias de sua aplicação, houve redução de 50% das mortes no trânsito.
– Essa redução seria vista até hoje se a lei, de fato, funcionasse. […] O nosso sistema preventivo é ineficaz. Temos uma lei que proíbe o uso de álcool, mas não fiscalizamos. Se fiscalizamos, não punimos e não obrigamos o uso do bafômetro. Não basta fazer uma lei.
R7