O ministro Joaquim Barbosa, relator do processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quinta-feira seu voto sobre o capítulo sete da denúncia, que trata do crime de lavagem de dinheiro envolvendo o ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto e ex-parlamentares do PT. Na sessão de ontem, ele sinalizou pela condenação dos ex-deputados Paulo Rocha e João Magno, mas apenas proclamou seu voto pela absolvição de Anita Leocádia, chefe de gabinete de Rocha.
Como o capítulo sete é considerado o mais simples da denúncia, é provável que o revisor do processo, Ricardo Lewandowski, também faça a leitura de seu voto na sessão de hoje. Segundo a denúncia, Adauto, Rocha, Magno e o ex-deputado professor Luizinho receberam quantias para diferentes fins repassadas mediante o esquema operacionalizado pelo empresário Marcos Valério, que também abasteceu o esquema de compra de votos no Congresso.
Na quinta-feira, Barbosa argumentou que não haviam provas para comprovar a ligação de Anita Leocádia com o esquema. “Embora o recebimento de dinheiro por meio da engrenagem oferecida pelo Rural seja suficiente para sustentar que Anita Leocádia contribuiu para a lavagem, eu entendo não haver elementos para afirmar que ela tinha conhecimentos dos crimes antecedentes”, disse o relator. “Não se pode ignorar que ela era uma mera subordinada de Paulo Rocha, sem acesso à cúpula do partido”, acrescentou.
Sobre Paulo Rocha, o ministro rechaçou a tese da defesa de que ele teria recebido recursos para saldar dívidas de campanha do diretório do PT no Pará, do qual o ex-deputado era dirigente. “Ao contrário do que sustentado por Paulo Rocha, não se trata de simples transferências de recurso do partido para o diretório. Na verdade, os valores foram repassados pelo núcleo de Marcos Valério, e não pelo PT. O próprio réu Paulo Rocha admite que Marcos Valério quando lhe procurou disse que estava à disposição para saldar dívidas do PT do Pará”, disse Barbosa. Paulo Rocha é acusado de receber R$ 920 mil do esquema operado por Valério.
Para Barbosa, a situação de João Magno é semelhante. “Tal como Rocha, João Magno também afirma que os valores teriam sido recebidos pelo PT para pagamento de dividas de campanha. Ocorre que o dinheiro foi repassado pelo núcleo de Marcos Valério através de terceiros a João Magno, que permaneceu oculto”, disse. “A ênfase dada que os recursos foram integralmente utilizados para saldar dívidas de campanha, não afasta a caracterização do delito”, destacou.
João Magno é acusado de receber R$ 350 mil do esquema. A denúncia afirma que ele tinha pleno conhecimento da origem criminosa dos recursos e que, para se preservar, utilizou-se de terceiros para o recebimento das quantias.
Após o voto dos dez ministros da Corte sobre o item sete da denúncia, os ministros passam a analisar o capítulo oitavo, dedicado à evasão de divisas e lavagem de dinheiro atribuídas aos publicitários Duda Mendonça e Zilmar Fernandes. O último capítulo, o dois, deverá levar ao plenário do Supremo o ápice do julgamento. É nesse ponto que estão descritas as condutas de Dirceu, Delúbio e José Genoino, ex-presidente do PT, que resultaram na acusação de formação de quadrilha. Os três já foram condenados por corrupção ativa, em julgamento encerrado ontem.
O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.
Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e do irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.
A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão. Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.
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