Depois de vários adiamentos e uma infinidade de rumores, a Foxconn iniciou a produção no Brasil do iPhone, o telefone celular da Apple. No começo de outubro os funcionários da fábrica que a companhia chinesa está instalando em Jundiaí (SP) iniciaram a montagem total do aparelho em ritmo quase diário. Ainda se trata, no entanto, de uma produção inicial e os aparelhos fabricados em Jundiaí não têm data para chegar ao mercado. De acordo com os trabalhadores que estão atuando na linha de montagem, cerca de duas mil unidades do aparelho já haviam sido produzidas na fábrica de Jundiaí. O iPad, o tablet da Apple que a Foxconn prometeu também produzir Brasil, ainda não teve sua linha de produção instalada. Oficialmente, a Foxconn sequer confirma a existência de uma unidade dedicada à produção do iPhone no Brasil.
Nesse primeiro momento, todo o trabalho está concentrado no iPhone 4, o modelo que antecede o último lançamento da Apple, o iPhone 4S, anunciado pela empresa apenas um dia antes da morte do fundador da Apple, Steve Jobs. A produção inicial está servindo como teste para a operação em larga escala, que a Foxconn pretende iniciar nas próximas semanas, a fim de conseguir atender, ao menos em parte, o mercado brasileiro para o Natal. Por conta disso, a empresa quer inaugurar oficialmente a fábrica de Jundiaí até meados do próximo mês com a presença da presidente Dilma Rousseff. A data para o início “oficial” das operações na unidade está condicionada à agenda da presidente, que ainda não confirmou quando estará disponível para para participar da cerimonia.
Apesar de a Foxconn não confirmar sua existência publicamente, a unidade de Jundiaí já está em funcionamento há praticamente três meses. Nas últimas semanas a companhia agregou 400 novos trabalhadores aos 700 que já haviam sido contratados e desde o início do mês iniciou um segundo turno de atividades. Agora, a fábrica opera sem interrupções das 6 da manhã até às 11:45 da noite. Boa parte desses trabalhadores ainda está em processo de treinamento.
Mesmo trabalhando há pouco tempo na companhia, boa parte deles também já entendeu que a Foxconn preza, como poucas empresas, a discrição de seus funcionários. Obrigados a assinar um termo de confidencialidade, os empregados da fabricante oficial dos produtos da Apple vivem sob a ameaça constante de demissão caso desrespeitem as normas de sigilo impostas pela companhia. “Eles dizem que é pra gente não falar nada nem em casa, com pai, mãe ou marido”, conta uma funcionária que optou por quebrar a lei do silêncio imposta pela Foxconn. “A gente pergunta, brinca, mas ninguém diz o que eles estão fazendo ai dentro. É um mistério só”, diz Roberto Moura, motorista de um dos muitos ônibus que, três vezes ao dia, engarrafam a pequena rua Steve Jobs que liga a Rodovia Anhanguera à fábrica da Foxconn, levando e trazendo os empregados da empresa.
O mistério é tão grande que nem mesmo o Sindicato dos Metalúrgicos de Jundiaí sabe ao certo como seus associados estão trabalhando. “Ainda não nos deixaram entrar nos galpões onde as linhas de montagem estão sendo instaladas, só nos permitiram entrar no pátio”, diz Luís Carlos Oliveira, vice-presidente do sindicato, que não acredita que a Foxconn já tenha iniciado a produção do iPhone. “Não ficamos sabendo de nenhuma carreta entrando com material lá, acho que não estão produzindo nada ainda não”, diz ele, confessando não estar completamente certo de sua afirmação. “Ninguém tem certeza de nada, aquilo é um segredo de estado”.
A única certeza é de que a Foxconn vai fazer o que for possível para manter no Brasil a cultura do segredo que tem marcado a sua história e, principalmente, a da Apple. A companhia de Steve Jobs adotou uma estratégia de nunca divulgar um detalhe sequer sobre suas operações ou lançamentos futuros. Alimentou, com isso, uma imensa indústria de boatos, rumores e análises que, em última instância, funcionou como uma poderosa ferramenta de marketing a seu favor. Hoje, por exemplo, existem publicações especializadas em divulgar rumores sobre qualquer coisa que envolva a Apple.
Além do contrato de confidencialidade e a absoluta ausência de informações oficiais – a empresa preferiu não comentar as informações publicadas nessa reportagem -, a Foxconn também muniu-se de aparato tecnológico para evitar vazamentos, sejam de informações, sejam de produtos. Em todas as linhas de montagem já instaladas a companhia montou sensíveis detectores de metais. Até na entrada dos banheiros de cada galpão foram colocados esses equipamentos. “O controle é rígido demais, nem ir ao banheiro sossegado a gente pode”, diz um outro funcionário.
Junto aos detectores, a companhia colocou uma série de fiscais, responsáveis por fazer revistas físicas nos funcionários sempre que o alarme disparava. “E ele disparava sempre, até mesmo com um isqueiro”, conta o mesmo funcionário. “A coisa estava exagerada e pedimos a eles para encontrar outra maneira de fazer o controle deles sem precisar ficar revistando todo mundo o tempo todo”, diz Luís, o vice-presidente do sindicato dos metalúrgicos. Nos últimos dias, o controle foi relaxado. Mas poucos duvidam que ele voltará à rigidez inicial quando a fábrica estiver operando em sua capacidade total.
IG