Intimidação sistemática, violência física ou psicológica e ataques nas redes sociais. Na semana passada entrou em vigor a Lei 14.811/2024, que inclui os crimes de bullying e cyberbullying no Código Penal. Sancionada pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a Lei torna as duas condutas como ato de constrangimento ilegal. Agora, o Código Penal prevê multa para quem cometer bullying, e reclusão e multa para quem cometer o mesmo crime por meios virtuais.
O PB Agora ouviu alguns especialistas que classificaram a Lei como um avanço, mas também apontaram para algumas falhas existentes na legislação que precisam ser ajustadas. E questionaram os efeitos práticos da Lei.
A nova regra define bullying como o ato de “intimidar sistematicamente, individualmente ou em grupo, mediante violência física ou psicológica, uma ou mais pessoas, de modo intencional e repetitivo, sem motivação evidente, por meio de atos de intimidação, de humilhação ou de discriminação, ou de ações verbais, morais, sexuais, sociais, psicológicas, físicas, materiais ou virtuais”. A pena é de multa, se a conduta não constituir crime mais grave.
Já o cyberbullying é classificado como intimidação sistemática por meio virtual, incluindo redes sociais, aplicativos e jogos online ou “qualquer meio ou ambiente digital”.
Território virtual. Se for realizado por meio da internet, rede social, aplicativos, jogos on-line ou transmitida em tempo real, a pena será de reclusão de dois a quatro anos, e multa, se a conduta não constituir crime mais grave”. Caso os crimes sejam cometidos em grupo, com mais de três atores, a pena poderá ser agravada. O mesmo vale para os casos em que os crimes envolverem o uso de armas.
O Código Penal também prevê agravantes se o bullying for cometido em grupo de mais de três autores, se houver uso de armas ou se envolver outros crimes violentos incluídos na legislação.
O advogado e professor do curso de Direito da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Luciano Nascimento, ressaltou que Lei 14.811/2024, em princípio, pode parecer uma conquista no campo da estigmatização do ser humano e eliminação do outro por uma construção linguística pejorativa como é o bullying.
O professor que recentemente tratou deste tema na UNIPÊ em João Pessoa, aponta algumas falhas na Lei e entende a punição prevista no texto, como uma dogmática simbólica. Isso porque as penas que ela traz ficam circunscrita a ideia de crime de menor potencial ofensivo.
‘Agora a dogmática penal que veio que prescreve a prática do bullying como um crime ou delito, pode parecer uma grande conquista, mas na prática do Direito, no mundo das acusações e das defesas para o poder judiciário decidir, essa dogmática penal pode ser caracterizada como uma dogmática simbólica, já que as penas que ela traz ficam circunscrita a ideia de crime de menor potencial ofensivo” observou em contato com o PB Agora.
Luciano Nascimento lembrou que quem trabalha com o Direito no Brasil sabe que não se compre pena no País com pena inferior a 8 anos de reclusão. Se a pena for entre 4 e 8, o regime é semiaberto, ficando livre durante o dia e voltando à noite para dormir no presídio.
“Mas nem a isso vai chegar. A Lei prescreve o bullying como um crime ou delito de menor potencial ofensivo. Pena máxima de 2 anos com qualificadora no caso de aumento de pena podendo chegar a quatro anos. Mesmo assim, as condenações não atingirão os quatro anos porque, em regra, o réu vai ser primário e tem uma série de direitos previstos no artigo 59 da parte geral do Código Penal Brasileiro. Então a nossa interpretação é que essa dogmática penal é uma dogmática simbólica e não terá efeito nenhum do ponto de vista prático do mundo do Direito” explicou.
A psicóloga e professora Girlene Vieira Lopes, tem outra visão da Lei. Em entrevista ao PB Agora, ela classificou a mudança na Lei 14.611-24 como um avanço no combate ao bullying. Isso porque a Lei segundo ela, prevê crimes bem mais duros no Estatuto da Criança e do Adolescente e aumenta a lista de crimes hediondos incluindo as práticas de bullying e cyberbullying no Código Penal.
“Eu acho isso um avanço muito importante. É fundamental que existam políticas públicas fortes que possam atuar nessas situações e dar um suporte principalmente às vítimas que sofrem de uma forma intensa afirmou.
A especialista ressaltou que o bullying deixa marcas muito fortes tanto na criança quanto no adolescente. Ela ressaltou que é importante nomear os envolvidos na prática bullying, bem como, nomear os envolvidos na prevenção e na identificação do enfrentamento.
Ela entende que os procedimentos de enfrentamento, devem existir dentro do contexto escolar, envolvendo professores, gestores, familiares e estudantes de uma forma geral.
“Os professores são integrantes muito importantes na comunidade educativa. Eles são aqueles que têm o papel primordial nesse processo pelo fato de estarem com os estudantes na maior parte do tempo. E por isso tem melhores condições de identificar possíveis situações e casos de bullying “, observou.
Toda essa equipe, segundo a especialista, precisa estar alinhada para verificar e atuar no combate a essas práticas deploráveis.
Ela também defendeu a necessidade de desenvolvimento de projetos de combate ao bullying dentro do ambiente da escola que possa trabalhar a prevenção no relacionamento e nas interações sociais e em todos os espaços da escola.
“Nós percebemos tudo isso como algo muito importante nesse enfrentamento, porque de fato, é algo muito sério o que acontece com a criança e com o adolescente que é vítima dessas práticas. Não podemos esquecer disso, que deixam marcas profundas que ficam na vida desses estudantes “, observou.
Por muito tempo, as vítimas de bullying não contavam com um amparo jurídico específico contra seus agressores. Contudo, uma lei que entrou em vigor em fevereiro de 2016 veio para dar força ao combate a esse problema. A Lei 13.185 instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying) em todo o território nacional.
Severino Lopes
PB Agora