O professor chileno aposentado Carlos Leddy, de 66 anos, ensinou aos três filhos e às duas netas o que eles deveriam fazer na hora de um terremoto. E ele tem experiência no assunto, já que viveu os três terremotos mais fortes registrados no país – e que figuram entre os piores do mundo – em 1960, 1985 e agora, em 2010.
"Eu sempre disse a eles: jamais percam a calma. O tremor começa devagar e vai acelerando e tornando-se mais violento. Muitas vezes o terremoto vem com um barulho e seu primeiro efeito é a falta de luz, a total escuridão", disse.
Leddy fala ainda que as ondas "não perdoam" depois dos tremores, e avançam na costa e que por isso, "se estiver perto do mar, corra pra longe".
Por conta dessa experiência, Leddy afirma dormir tranquilo, mesmo sabendo dos frequentes tremores e das réplicas típicas de um país sísmico como o Chile.
"Cada lugar tem um problema. Aqui são os terremotos", afirmou.
Depois de ter enfrentado o último terremoto, há 25 anos, Leddy afirma que a pior "revelação" do tremor de 8,8 graus de magnitude do último sábado foi perceber que o Chile "não avançou tanto" na questão social.
"Fiquei com vergonha ao ver aquelas imagens dos saques na televisão. Nosso país avançou tanto política e economicamente e agora vemos essa realidade da diferença social", disse.
Apesar da decepção com a desigualdade do país, Leddy se diz satisfeito em perceber que as construções chilenas tornaram-se mais resistentes desde os terremotos de 1960 – o mais grave já registrado no mundo – e de 1985.
"Naqueles primeiros terremotos as paredes caiam em cima da gente aqui em Santiago. Agora não. Veja que está quase tudo em pé", afirmou
Leddy sente, no entanto, a perda de vidas nas praias do litoral chileno.
"Lá as construções eram de madeira e não iriam resistir mesmo ao maremoto", disse.
Assim como Leddy, a chilena Claudia Garcia, que trabalha em uma rede hoteleira, também afirmou que consegue manter a calma e dormir tranquila, apesar de dizer que sente "angústia" ao lembrar da noite do terremoto de sábado.
"Eu estava dormindo e acordei com um barulho, um tremor suave que foi aumentando tanto, tanto que eu não podia ficar em pé. Mas aprendi que não é para perder a calma", disse. Ela contou que ficou sentada na cama enquanto ao redor tudo sacudia – luminária, televisão, e outros objetos.
"Aí veio a escuridão total. Quando o tremor parou, coloquei uma roupa, sapatos e peguei os documentos e desci do prédio pelas escadas", disse, relembrando que os pais a ensinaram a não sair sem documentos e sapatos nem correr nas escadas, para não se machucar na correria.
García, de 31 anos é Viña del Mar, às margens do oceano Pacífico, e atualmente mora em Santiago. Ela recordou que ainda era criança quando viveu a experiência de seu primeiro terremoto.
"Eu estava passeando de bicicleta e vi quando o chão tremeu e todos os postes balançavam, como se fossem de borracha. Tudo muito irreal, como um filme. Não me desesperei, mas recordar me angustia", disse.
País ‘bom’
A tentativa de manter a calma foi o que também aprendeu o taxista argentino José Montesino, de 55 anos, que mora em Santiago desde 1984.
"Desta vez senti como se mãos de gigantes irritados sacudiam a minha casa inteira. Foi um barulho ensurdecedor. Quebrou tudo. Televisão, copos, pratos. Mas isso a gente compra de novo", disse ele.
Montesino disse que mesmo com estas experiências, não pretende deixar o Chile.
"Fora os terremotos, tudo é muito bom aqui. Um país que está progredindo muito, onde o crédito é farto pra todo mundo e a segurança pública também", afirmou
"É um país muito bom e os chilenos são fortes como poucos. Aguentam tudo, até terremoto e sempre recomeçam", disse.
O coveiro chileno Antonio Pichon, de 70 anos, do cemitério central de Santiago, disse que o terremoto de sábado passado não o surpreendeu.
"Eu já o esperava. Mas pensava que seria em março. Eles sempre aparecem a cada vinte e cinco anos. Pode fazer as contas: 1960, 1985 e 2010".
O garçon Humberto Lopez, de 48 anos, resumiu a sensação de muitos chilenos após o tremor que abalou as estruturas do país, mas não a calma dos chilenos.
"Já estamos acostumados. E a calma é a solução", disse.
G1
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