Não se fala em outra coisa que não seja a votação e aprovação pela Câmara dos Deputados na noite da quarta-feira (14/8) do projeto de lei que atualiza a Lei do Abuso de Autoridade. Na verdade a lei antes omissa, para alguns casos, passou criminaliza expressamente os abusos cometidos por servidores públicos, juízes, membros do Ministério Público e das Forças Armadas, seguindo agora segue para sanção presidencial.
O Presidente, Jair Bolsonaro, já declarou que haverá algum veto, contudo, sem apresentar maiores informações ou detalhes.
Nas associações de classe que representam magistrados e membros do ministério público a gritaria é geral, sob o argumento de que a lei avilta direitos e garantias das classes.
Em nota o Presidente da AMB, Juiz Jayme de Oliveira, afirmou categoricamente ser contrário ao projeto de lei aprovado:
“A necessária punição a quem atue com abuso de autoridade não pode servir, sob qualquer pretexto, a intimidar ou de qualquer forma subtrair a independência do Poder Judiciário e seus juízes, que tanto realizam no combate à corrupção, na garantia dos direitos fundamentais e na consolidação da democracia.”
No sentido da contramão, o Presidente do STJ, Ministro João Otávio Noronha, se manifestou favorável ao texto de lei em entrevista para o portal Conjur:
“Aquilo vale para todas as autoridades, seja do Judiciário, seja do Executivo, seja do Legislativo. A lei é para todos. E nós também, juízes, temos que ter limites na nossa atuação, assim como tem os deputados, como tem o presidente da República, como tem os ministros do Executivo. Portanto, acredito que o que tem aí deve ser um aprimoramento da legislação”, afirma.
Presidente da Comissão Nacional de Legislação do Conselho Federal OAB, o advogado Ticiano Figueiredo auxiliou na tramitação do projeto na Câmara e comemorou a aprovação da proposta na Casa em entrevista publicado no Migalhas.
“É uma vitória importante para toda sociedade. Nenhum abuso deve ser admitido! A aprovação do PL demonstra a importância da retomada do diálogo entre a OAB e o Congresso Nacional e é a prova inequívoca da defesa intransigente que o Presidente Felipe Santa Cruz vem fazendo das prerrogativas do advogado.”
Particularmente, venho acompanhado a aparente união da Magistratura e Ministério Público contrários ao projeto de lei aprovado, que lista mais de 30 ações que, se forem praticadas com o intuito de prejudicar ou beneficiar alguém, configuram abuso de autoridade.
As mais debatidas são: obter provas por meios ilícitos; executar mandado de busca e apreensão de forma ostensiva para expor o investigado; impedir encontro reservado entre presos e seus advogados; decretar a condução coercitiva de testemunhas ou de investigados que não tenham sido intimados a depor; realização interceptação telefônica sem autorização judicial; e decretação de prisão provisória em “manifesta desconformidade com as hipóteses legais”.
Em artigo intitulado “Lei do abuso: juízes e procuradores não confiam neles mesmos?” recente o Professor Leino Luiz Streck, citando crônica de Élio Gaspari foi cirúrgico:
“Penso que devemos ir mais fundo. E minha inspiração vem de uma antiga coluna de Élio Gaspari — que não é jurista e não me consta ter escrito algum livro sobre hermenêutica. Ele foi na jugular do problema:
‘Antes de concordar com o fim do mundo, fica uma pergunta: quem poderá condenar o policial, procurador ou o juiz? Um magistrado, só um magistrado. Se os procuradores da ‘lava jato’, o juiz Moro… [acrescento: e todos os que criticam o projeto não confiam na justiça], por que alguém haverá de fazê-lo?’
Perfeito. O que Gaspari quer dizer? Simples. Que, pela vez primeira, os juízes e membros do MP estão com medo de uma lei, no caso, a do abuso de autoridade, lei que eles mesmos aplicarão.
Gaspari repergunta: por qual razão os juízes deveriam temer a nova lei, se esta será aplicada pelos juízes e fiscalizada pelo MP?
O judiciário e o MP não são confiáveis? Responde Gaspari: Os juízes não confiam neles mesmos.”
É fato que a lei precisa de alguma depuração, mas foi preciso trazer limites ao Poder Judiciário e ao Ministério Público, pois como asseverou o Barão de Montesquieu, “Até a virtude precisa de limites”.
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