Há um fato bastante surpreendente na democracia brasileira: um ministro do Supremo Tribunal Federal parece ter mais poderes do que Parlamentares e do que o Presidente da República eleitos pelo voto popular.
A Constituição Federal de 1988 foi muito generosa com o Poder Judiciário e o Ministério Público. O Brasil tinha acabado de sair de um período de vinte e um anos de ditadura militar. Não havia independência entre os Poderes e as instituições eram aparelhadas pelo aparato burocrático militar.
Vieram as “diretas já”, a “redemocratização”, e a “constituição cidadã”. O Judiciário e o Ministério Público ganharam, respectivamente, independência e ampla autonomia.
O Supremo da década de 1990 atuou de forma bastante comedida em relação às decisões do Executivo e Legislativo. Tivemos vários planos econômicos (p. ex. “cruzado, “real”), medidas de reforma administrativa do Estado brasileiro, impeachment de presidente (Collor). Enfim, foi uma década bem agitada e o STF, em geral, foi bastante comedido em relação às decisões políticas.
Contudo, dos anos 2000 em diante, as coisas começaram a mudar. Havia um certo clima nacional de que o Estado deveria ser mais presente na promoção de oportunidades e o Judiciário mais atuante na proteção de direitos. O poder do STF se expandiu.
Nessa época, alguns começaram a dizer: “olha, o poder do Supremo se expandiu tanto que vivemos em uma ‘supremocracia’”. Supremocracia? Esse termo indicava que o Brasil estava começando a viver sob o governo do Supremo Tribunal Federal. A Corte era também regente dos rumos políticos, econômicos e sociais do país ao lado ou sobre os Poderes Executivo e Legislativo.
Na última década, contudo, não foi o poder do STF, enquanto Corte colegiada, que se expandiu. Foi o poder dos ministros, individualmente, que foi ampliado. Os ministros passaram a dar entrevistas, a dar mais decisões monocráticas (individuais) e, mais recentemente, posicionar-se em redes sociais. Por isso, muitos têm dito que vivemos na época da “ministocracia”. Ministocracia? O governo de ministros individuais, não eleitos, mas bastante poderosos.
Sim, a Constituição de 1988 deu muito poder ao Supremo. Os ministros gostaram. Recentemente, um ministro pode declarar nula condenações de um ex-presidente e torná-lo elegível. Um ministro, sozinho! Não cabe aqui perguntar se a decisão foi acertada, mas sim refletir: o que ministros, não eleitos, tão poderosos indicam sobre nossa democracia, instituições e rumos de nosso país?
Na época do Império, na Constituição de 1824, Dom João VI assumiu o Poder Moderador. Era um poder sobre os outros Poderes, tornava o imperador inviolável e não sujeito à responsabilização. E pensar que quase duzentos anos depois, o arbítrio moderador havia sido superado.