Há 50 anos, o fotógrafo Roberto Stuckert, 66, chegava a Brasília para cobrir a construção e a inauguração da capital federal. Anos mais tarde, já com residência fixa na cidade, ele e o filho Ricardo, – que seguiu os passos do pai – dividiriam uma rara coincidência no currículo: Ricardo, o Stuckinha, foi escolhido o fotógrafo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva; já Roberto, o Stuckão, desempenhou o mesmo cargo na gestão do ex-presidente João Baptista Figueiredo, entre 1979 e 1985. Mas poucos sabem que a história da família Stuckert com a fotografia, vem de bem antes, quando depois da Primeira Guerra Mundial, o bisavô de Ricardo, Eduardo Roberto Stuckert, embarcou de Lausanne, na Suíça, em direção à América do Sul, sem destino definido.
Na primeira parada Eduardo Roberto Stuckert, encantou-se com a Paraíba e por lá ficou. Além de fotógrafo, era pintor e tradutor. Passou o primeiro ofício aos filhos, depois aos netos. É uma tradição familiar. “Na minha família, entre vivos e mortos, são 33 fotógrafos. Sou a quarta geração de uma família de fotógrafos”, diz Ricardo Stuckert.
Ainda sobre sua paixão pela fotografia, Ricardo disse: “Nasci vendo meu pai, Roberto Stuckert, com uma câmera na mão. Minha paixão pela fotografia começou muito cedo, quando eu ainda era criança. Aos 14 anos, já acompanhava meu pai e entrei pela primeira vez em um laboratório fotográfico. Lá, vi uma fotografia nascendo no papel fotográfico. Ali, achei que fosse uma mágica. Me encantei naquele momento e descobri a magia da fotografia. Aos 18, comecei a trabalhar no jornal O GLOBO. De lá pra cá, não parei mais. A fotografia não é só o meu trabalho, é a minha vida. Nasci em uma família de fotógrafos. Tudo que eu aprendi, tudo que eu sou, a maneira como vejo o mundo é por meio da fotografia”, comentou.
Ricardo e Lula – Questionado sobre como começou sua parceria com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que se estende até os dias atuais, Ricardo Stuckert, disse que conheceu o ex-presidente nas eleições presidenciais de 2002. “Na época era fotógrafo da revista Istoé, em Brasília. Pouco antes do primeiro turno sugeri à revista registrar uma semana de cada um dos quatro principais candidatos daquela eleição. A ideia era fotografar tudo o que acontecesse em sete dias da vida de Anthony Garotinho, Ciro Gomes, José Serra e Lula, exatamente nessa ordem. Consegui fazer fotos inéditas e diferenciadas com os três primeiros candidatos, e quando chegou à vez do Lula a revista me pressionou que queria algo diferente com ele também. Por isso, passei a semana tentando convencer o ex-presidente a abrir seu apartamento de São Bernardo do Campo para algumas fotos, mas a resposta era sempre negativa. Fiquei batalhando e ele dizendo: ‘Não pode, na minha casa ninguém entra’. Até a dona Marisa me pediu pra respeitar a restrição. Mas eu não desisti. Consegui uma brecha numa sexta-feira, último dia em que estaria ao lado do então candidato. Cheguei à casa dele às 5h30 da manhã. Ele já estava acordado, me mandou subir. Fiz fotos dele tomando café da manhã, coisas assim, mas queria algo mais. De repente aparece a cachorrinha dele, Michelle. Ele pega ela, levanta nos braços e dá um beijo. Foi a foto que abriu a matéria”, comentou Ricardo.
Segundo o fotógrafo, o ex-presidente Lula gostou do resultado. “Pediu de presente a foto com a cadela – e alguns dias depois da publicação da matéria eu o encontrei no último debate antes do primeiro turno. Ele bateu nas minhas costas e disse: ‘O Kotscho já falou com você?’. Ricardo Kotscho era o assessor de imprensa dele. ‘Acho que ele tem um negócio pra te falar. É um convite’. Na hora caiu a ficha. Lula queria que eu fosse seu fotógrafo oficial caso fosse eleito. Um convite que aceitei sem pensar duas vezes. Quando eu teria outra oportunidade de fotografar um operário no poder? É uma experiência fantástica poder acompanhá-lo desde 2003. Lula é carismático, uma pessoa simples. Ele é aquilo que vc vê nas fotos. Uma pessoa que gostar de estar ao lado do povo. É ali, no meio de uma multidão ou abraçando uma criança, um idoso, um trabalhador que que ele se realiza. Meu maior desafio é mostrar para as pessoas o que o Lula é por meio da fotografia. Uma vez, quando era presidente da República, ele me ligou no domingo e disse: ‘Vem aqui em casa. Estou pescando e quero que você faça umas fotos’. Eu fui e quando cheguei no Palácio da Alvorada comecei a fazer as fotos. Ele olhou pra mim e falou ‘Stuckinha, é pra fotografar o peixe, não eu’. Entende? Ele não tem essa vaidade. Ele é uma pessoa simples”, comentou Ricardo.
Livros – Em 2004, Ricardo lançou o livro, Lula 500 dias em fotos! Neste sentido perguntamos como ele avaliou esse projeto e se pretende lançar novos livros das suas coberturas fotográficas. “Com certeza. Agora estou na fase de finalização de um livro de fotografia sobre os povos originários do Brasil. Comecei a fotografá-los em 1997 e, em 2015, decidi retomar este projeto. Acho importante divulgar a cultura brasileira e mostrar como vivem hoje os povos originários e acredito que a fotografia tem esse papel de levar para as pessoas dos mais diversos lugares a cultura indígena. Em todo o Brasil, temos hoje quase 900 mil indígenas e mais de 300 etnias falando 274 línguas diferentes. Cada etnia tem seus costumes, tradições, rituais, danças. Cada aldeia que eu visito é um aprendizado. O modo de viver do indígena é fantástico. Eles vivem com simplicidade, com aquilo que a floresta oferece. Da terra, tiram os alimentos e as plantas medicinais. Do rio, bebem a água e pescam o peixe para saciar a fome. Têm orgulho de manter a cultura preservada. Nos ensinam a importância de viver em comunidade, de respeitar e preservar a natureza”, comentou.
Ele destaca que outro ensinamento muito importante é em relação ao tempo. “O tempo na floresta é diferente do daqui. Não tem essa pressa, essa ansiedade da cidade. Lá, tem todo um ritual, você tem que respeitar a cultura, tem que respirar a cultura, tem todo esse trabalho, essa calma e essa sabedoria.”
Algo que queríamos saber é como ele avalia a importância da humanização das fotos para os políticos. Neste sentido, ele disse que a fotografia é, seguramente, um dos melhores meios para você mostrar a narrativa do discurso do político. “É por meio da imagem que o fotógrafo consegue traduzir o trabalho, as realizações, e, claro as ideias do político. A fotografia é o instrumento fundamental para o político transmitir sua mensagem por meio da imagem”, disse Ricardo.
Família Stuckert na história política – Até a divulgação da foto oficial da Presidenta Dilma era Pai e filho os autores das duas únicas fotos oficiais de presidentes que posaram sorrindo – apenas Lula e Figueiredo toparam a imagem “sorridente”. Além disso, ambos conheceram seus futuros “chefes” quando trabalhavam na cobertura dos políticos antes da posse.
Na trilha do pai e do irmão, Roberto Filho, o Stucka, assumiu a mesma função, mas começou trabalhar com Dilma na cobertura de campanha da pré-candidata do PT à Presidência. Ricardo comenta as coincidências entre o trio: “Meu pai foi o fotógrafo do último presidente militar do Brasil. Eu fui o fotógrafo do primeiro operário eleito presidente. E meu irmão é o fotógrafo da primeira mulher a assumir a Presidência”.
Foi em Brasília também que o pai de Stuckão, o fotógrafo Eduardo Roberto, decidiu fundar, na década de 70, a agência de fotojornalismo da família: a Stuckert Press, que abastecia os principais veículos jornalísticos do país com imagens do Planalto Central – até hoje em funcionamento. Cheio de histórias na bagagem, o bem-humorado patriarca da família estima ser o fotógrafo mais antigo de Brasília na ativa. Além de ter sido o fotógrafo de Figueiredo, Stuckão passou por alguns dos principais jornais e revistas do país, cobriu três Copas do Mundo e já perdeu a conta de quantos líderes políticos passaram pelas suas lentes.
Redação
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