A perda da comunidade e a erosão democrática

PUBLICIDADE

No livro “O descontentamento da democracia”, o professor de Harvard, Michael Sandel, examina as causas da erosão da democracia contemporânea. Por meio de análise da história política dos EUA, ele observa que, do séc. XIX até a primeira metade do séc. XX, prevaleceu o ideal cívico republicano de “autogoverno”.

O ideal republicano entende ser fundamental que os indivíduos se “autogovernem”, deliberando sobre o “bem comum” da comunidade política. A participação cria um vínculo moral de pertencimento, fomentando “virtudes cívicas”. A liberdade só pode ser experimentada quando indivíduos compartilham de escolhas e mantém vínculos morais.

Esse ideal se orienta por uma “economia política da cidadania” em que os cidadãos podem participar ativamente das decisões políticas e econômicas. O governo pode atuar, ativamente, no cultivo de qualidades de caráter do cidadão. Assim, a coesão das comunidades e a liberdade cidadã compartilhada podem fortalecer a democracia.

Contudo, a partir do séc. XX, prevaleceu o “ideal liberal de neutralidade”. Esse ideal diz que todos os valores e decisões individuais têm igual importância, de modo que as comunidades e o governo devem ser neutros quanto às escolhas dos indivíduos. A liberdade está no procedimento: siga as regras, não prejudique outrem, e faça o que quiser.

Nesse modelo, direita e esquerda compartilham a crença de que as comunidades e o governo não podem induzir um caráter cívico e comunitário. A preocupação deve ser, estritamente, aumentar o bem-estar e o consumo, seja pelo aumento da riqueza (preocupação da direita), seja por sua distribuição (preocupação da esquerda).

Sob o ideal liberal, a globalização da economia e o discurso da meritocracia fizeram com que: 1) o ideal de autogoverno fosse abandonado e as elites assumiram o controle; 2) as comunidades se enfraqueceram diante do poder do Estado dominado por elites; e 3) os indivíduos que não se adequaram à competição foram deixados para trás, tornando-se descontentes e ressentidos.

De fato, a tradição republicana tem um grande problema: comunidades e o governo podem se tornar perversos e, em nome do bem comum, podem fustigar indivíduos. Ainda assim, Sandel tem um ponto importante: democracia sem comunidades cívicas integradoras e sem possibilidade de participação real no autogoverno leva ao descontentamento.

Quando as elites assumem o controle, a economia opera tão-somente para mais consumo, e não há incentivos para o desenvolvimento de virtudes cívicas, aprofunda-se o descontentamento da democracia e abre-se espaço para o populismo. Em meio à polarização e ao ressentimento, quem cuidará da fraternidade que alicerça o ideal democrático?

Anderson Paz

PUBLICIDADE

Últimas notícias

Homem é morto a tiros por homens de moto em plena luz do dia no Cristo Redentor

Na manhã desta quinta-feira (28), um homicídio chocou os moradores da Rua Felinto de Arruda…

28 de novembro de 2024

Mesmo com candidatura de João ao Senado, Jhony não descarta PSB na disputa pelo Governo em 2026: “Há espaço”

O ex-candidato a prefeito de Campina Grande, Jhony Bezerra (PSB), demonstrou seu apoio à candidatura…

28 de novembro de 2024

Prefeito de Serra Redonda é intimado a explicar irregularidades em contrato de mais de meio milhão

O Tribunal de Contas do Estado da Paraíba (TCE-PB) intimou o prefeito de Serra Redonda,…

28 de novembro de 2024

Morre o comunicador e publicitário Cacá Teixeira, aos 64 anos

O jornalista, locutor e cineasta Cacá Teixeira faleceu na madrugada desta quinta-feira (28), aos 64…

28 de novembro de 2024

Mais de 3,2 mil cartinhas do Papai Noel dos Correios estão disponíveis para adoção na PB

Na Paraíba, mais de 3,2 mil cartinhas da campanha Papai Noel dos Correios esperam por…

28 de novembro de 2024

Começa nesta quinta-feira, 1º Festival Literário Internacional da Paraíba

Música, teatro, gastronomia e literatura no encontro de autores com leitores. Começa nesta quinta-feira (28)…

28 de novembro de 2024