Mesmo diante da possibilidade de condenação ao pagamento de multa por litigância de má fé, alguns dos condenados pela lei da ficha limpa ainda insistem em ganhar tempo e tentam atrasar o trânsito em julgado do mérito da condenação. As manobras acontecem dez anos após a implantação da lei 135/2010, conquistada por um projeto de iniciativa da pressão popular em 2010, popularmente conhecida como a Lei da Ficha Limpa.
Após uma década, no entanto, muitos se perguntam se a lei realmente surtiu os efeitos esperados. O advogado eleitoralista e ex-juiz do Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, Marcos Souto Maior Filho, admite que a lei não é perfeita, mas que, apesar de alguns casuísmos, cumpre seu mister, salvaguardando a legitimidade das eleições, impedindo que manobras ímprobas e criminosas possibilitem na disputa candidatos condenados.
Mas e as brechas que auxiliam o drible desses candidatos inaptos para se firmar na disputa, sobretudo nestas eleições de 2020?
A resposta é reflexiva.
O que alguns chamam como drible, o direito eleitoral classifica de garantia constitucional da ampla defesa e do contraditório. Antes da lei, havia sérios problemas no tocante a execução imediata de cassações, a nulidade de processo por falta de citação do vice, questões técnicas, que foram sanadas com o advento da legislação vigente.
O fato é que a lei impõe a cidadãos que tenham contra si condenações criminais, que tenham sido expulsos a bem do serviço público, que tenham sido punidos por conselho de profissionais ou que tenham praticado crimes hediondos, do colarinho branco, além da malversação do dinheiro público, sem falar nas rejeições de contas que os tribunais de contas realiza de gestores, que sejam excluídos do processo.
A função da lei é dar mais rigor, criar uma peneira para tentar separar o joio do trigo, afastar o mal gestor das outras pessoas, seguindo para o processo das eleições apenas os que forem aptos nos termos da legislação, com condições de elegibilidade e que não pese contra si nenhuma inelegibilidade.
Muitos candidatos, todavia pagam para ver.
“BY-PASS”
Levantamento do portal G1, por exemplo, mostra que pelo menos 356 candidatos no páreo nas eleições desse ano têm condenação no Tribunal de Contas da União e caso não sejam julgados até o dia 26 desse mês poderão concorrer ao pleito de 15 de novembro, mesmo sob o risco de ganhar e não levar, já que, se condenados pela lei, podem ter os votos anulados.
Na Paraíba, a ex-prefeita de Cuité, Euda Fabiana é um dos exemplos que busca garantia constitucional nas brechas da lei para poder reverter suas reiteradas condenações por improbidade administrativa devido a irregularidades em licitações na época em que geriu a cidade. Apesar da condenação nas costas, ainda em 2018, Euda tentou, sem sucesso, disputar as eleições para deputada estadual. A candidatura dela foi impugnada pela Procuradoria Regional Eleitoral que alertou que o ato de improbidade administrativa pelo qual a ex-gestora foi condenada deu-se de forma dolosa, não culposa.
Já os candidatos que não conseguem escapar da ficha limpa, lançam mão de uma espécie de ‘plano B’, emplacando parentes como substitutos nas disputas. A maioria é tachado como ‘laranjas’ dos candidatos que tiveram o registro frustrado.
Condenado até 2030, Germano Lacerda, do PSB, por exemplo, renunciou semana passada à disputa pela prefeitura de Brejo do Cruz e lançou nada mais nada menos que a esposa de seu filho, Elaine Salviano, em seu lugar. O socialista é condenado em ação de improbidade administrativa, com ressarcimento ao erário e, mesmo assim, tentou registrar a candidatura nas eleições desse ano.
Outra desistência foi anunciada essa semana. O atual prefeito de Lagoa, no Sertão da Paraíba, Gilbertinho Linhares (Republicanos) declinou da disputa pela reeleição. A confirmação da renúncia no pleito já está, inclusive, na página oficial do TSE no DivulgaCand. Gilbertinho sofreu pedido de impugnação e a justiça eleitoral negou seu registro. Ele estava inapto e indeferido e havia a possibilidade de manter a candidatura através de recurso no TRE-PB. O prefeito será substituído na candidatura pela sua tia, a professora, Maria Rodrigues Linhares. Ela tem 68 anos.
No fim, a lei vem sendo aplicada, mas está longe de ser perfeita, já que sofre para contornar aquele famigerado ‘jeitinho brasileiro’
Márcia Dias
PB Agora
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