Nestes tempos pós-julgamento do ‘mensalão’ em que o país acompanhou o trabalho dos Juízes de sua mais Alta Corte de Justiça, passo a veicular uma série de três artigos sobre a nobre profissão de julgar.
Com tais textos, presto homenagens a todos os Magistrados paraibanos e o faço na pessoa de uma destacada mulher que pela primeira vez em nossa história assume, a partir de amanhã, a chefia do Poder Judiciário da Paraíba, a eminente Desembargadora Maria de Fátima Bezerra Cavalcanti.
Estendo a homenagem aos valorosos Juízes acreanos na pessoa do ínclito Desembargador Roberto Barros que nesse mesmo dia 1º/02/03 toma posse na Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Acre a tempo de agradeçer-lhe o honroso convite para a solenidade, mas, infelizmente, não poderei comparecer.
Muitos são os(as) jovens que sonham com a carreira da magistratura e sempre que me deparo com um(a) deles(as), incentivo tal propósito recomendando-lhes a prática da boa leitura não só dos textos legais, mas também da doutrina essencial e, por fim, da jurisprudência dos Tribunais Superiores e do STF representativa dos temas/questões mais comuns na vida jurídica.
Cabe ao Juiz aplicar a lei e, nesse labor, sua principal qualidade é a sólida formação jurídica, a imparcialidade, o bom senso e o equilíbrio, pois lhe é exigido, no mor das vezes, não apenas simplesmente aplicá-la, mas também interpretá-la.
Já dizia o velho Ulpiano que: “O sentido da lei se deduz tanto do seu espírito, como da letra da lei”.
Outro jurista romano, Celso, no Digesto, pontuou que: "Conhecer as leis não significa tomar conhecimento de suas palavras, mas da força e poder destas."
Para o grande Aristóteles: “(…) a lei é a razão sem paixão”.
É certo que não precisa almejar heroísmo – embora muitos tenham sacrificado a própria vida para não transigir com criminosos –, mas, como recordou o Ministro Celso de Mello no julgamento do mensalão, citando Rui Barbosa, “(…) o bom ladrão salvou-se na cruz, mas não há salvação possível para o juiz covarde”.
O instrumento de atuação do magistrado é o processo, mais conhecido como “autos” e composto de petições das partes (autor e réu) e outros interessados (litisconsortes), documentos, perícias, declarações, depoimentos, etc., que possui também um sentido material de proteção às partes como garantia constitucional, isso porque o exercício da função jurisdicional obedece aos limites do devido processo legal (CF., art. 5º, LIV) e assenta-se no binômio “poderes-deveres”.
Para o saudoso jurista pátrio San Tiago Dantas, citado pelo emérito professor de direito constitucional da Universidade de São Paulo, Uadi Lammêgo Bulos, admitindo a acepção do termo mais ampla:
“(…) O verdadeiro significado da terminologia due processo of law, no nosso idioma, seria “perfeita adequação ao direito” e não ao “devido processo legal”. (Direito Constitucional ao alcance de todos, 2ª ed., Ed. Saraiva, 2008, p. 326).
O Juiz é o intérprete da lei, por excelência e segundo Clóvis Bevilácqua:
“Interpretar a lei é revelar o pensamento que anima suas palavras”, enquanto para Carlos Maximiliano, “interpretar é explicar, esclarecer, dar o significado do vocábulo, atitude ou gesto; reproduzir por outras palavras um pensamento exteriorizado; mostrar o sentido verdadeiro de uma expressão; extrair da frase sentença ou norma, tudo ela contém. Esclarecer seu significado não é apenas no plano abstrato; é sobretudo revelar o sentido apropriado para a vida real, e conducente a uma decisão reta” (HERMENÊUTICA E APLICAÇÃO DO DIREITO, 20ª. ed., Rio de Janeiro, Editora Forense, 2011, p. 07).
Na esfera penal, o Juiz não pode assumir papel de acusador como certa vez advertiu o jurista Geraldo Prado em duros termos:
“Aquele que tem um Juiz por acusador, precisa de Deus como defensor. E, às vezes, isso não é suficiente”.
Tampouco, no cível, pode atuar a favor da parte como se dela advogado fosse. Já notara o velho João Monteiro, que “(…) a imparcialidade do Juiz para com as partes é a primeira garantia de justiça”.
Pietro Calamandrei, prefaciando sua clássica obra, ELES, OS JUÍZES, VISTOS POR NÓS, OS ADVOGADOS, na edição de 1938, asseverou:
“Os juízes são como membros de uma ordem religiosa: é preciso que cada um deles seja um exemplo de virtude, se não quiser que os crentes percam a fé”.
Por isso mesmo, o filósofo inglês Francis Bacon pregava que a Justiça deve estar colocada numa espécie de altar para os juízes bem realizarem o seu múnus, o jus dicere, de modo a receber de todos a devida referência e respeito.
Para que atue com imparcialidade e independência, goza das garantias constitucionais da vitaliciedade, inamovibilidade e irredutilidade de subsídio (CF., art. 95, I a III), embora esta última não venha sendo materialmente respeitada vez que os subsídios sofreram decréscimo por anos de inflação e falta de reajuste, o último, de 5% demorou mais de 05 anos para ser concedido e com uma defasagem remuneratória já em torno de 30%.
A doutrina da separação de poderes foi concebida, em grande parte, para que os Juízes tivessem independência em relação aos outros poderes do Estado, funcionando como um poder-garante.
Montesquieu, em O ESPÍRITO DAS LEIS, discorrendo sobre a tutela da liberdade, com acuidade observou:
“Não haverá também liberdade se o poder de julgar não estiver separado do Poder Legislativo e do Executivo. Se estiver ligado ao Legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário, pois o Juiz seria legislador. Se estivesse ligado ao Executivo, o Juiz poderia ter a força do opressor”.
Por isso, a ninguém deve interessar o enfraquecimento do Judiciário e o mau disso, mostra a história das nações, inclusive da nossa, pois é a última cidadela contra o arbítrio, a ilegalidade, o abuso de poder e a injustiça.