A Câmara se prepara para votar amanhã a segunda denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente Michel Temer e está em jogo algo muito além da permanência do peemedebista à frente do Palácio do Planalto: espaços de poder. Enquanto parte da base aliada anda “raivosa”, nas palavras de aliados de Temer, por cargos e verbas e aproveita até o último minuto para barganhar, deputados próximos ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), querem ampliar o poder de decisão do colega.
É certo que a oposição não conseguirá os 342 votos para dar seguimento à denúncia contra Temer por obstrução de Justiça e organização criminosa junto aos ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral). Entretanto, o número no placar dará o norte sobre como funcionarão as negociações até dezembro de 2018 entre Planalto e Congresso. Aliados trabalham dia e noite para ultrapassar os 270 votos e mostrar que o governo ainda tem capacidade de aglutinar a base e aprovar reformas importantes. Por outro lado, a oposição acredita que Temer não chegará a 240 votos e isso enfraquecerá ainda mais a governabilidade. Na primeira denúncia, o presidente contou com o apoio de 263 parlamentares.
De acordo com o mapa de votos feito por aliados do presidente no fim de semana, há o apoio certo de 247 deputados e cerca de 45 indecisos, que ameaçam declarar “abstenção” ao microfone para não se comprometerem com o governo. A estratégia é trabalhar esse grupo até o último minuto. Com o objetivo, líderes da base governista se reuniram, na noite de ontem, no Palácio da Alvorada, para alinhar os últimos ajustes e aparar as arestas existentes sobre favores, oferta de cargos para apadrinhados políticos e liberação de emendas.
O presidente tem se comprometido pessoalmente com alguns parlamentares da base aliada, mas tem cobrado fidelidade, sobretudo em relação à agenda pós-denúncia. Interlocutores de Temer asseguram que o peemedebista procura, nesta reta final de governo, se cercar de parlamentares que deem segurança e garantia de que continuarão com o governo até o fim. “Alguns parlamentares dizem que estão com o governo, mas dão sinais de insatisfação. Não existe isto, de ser a favor do governo e contra o presidente”, diz uma fonte palaciana. “Agora é a hora da verdade. Se quer estar com o presidente, tem que se comprometer. Não vamos aceitar que se abstenha e venha cobrar alguma coisa”, alerta outro aliado de Temer.
Jogo dividido
Um outro grupo, além de cargos e emendas, quer mais. Aliados de Rodrigo Maia duvidam que Temer conseguirá mais de 250 votos amanhã em plenário e a governabilidade estaria comprometida. Para isso, sugerem que o peemedebista se comprometa a dar mais espaço no governo para os presidentes da Câmara e do Senado. “Seria uma forma de parlamentarismo branco. O Temer não tem mais o apoio do Congresso e o país não pode ficar parado até 2019. A ideia é um gabinete compartilhado, no qual Temer, Maia e Eunício (Oliveira, presidente do Senado) tomem juntos as decisões, principalmente, em relação à área econômica”, explica um deputado defensor da ideia.
Interlocutores no Palácio do Planalto afirmam que, na prática, o acordo com o Congresso já existe, afinal, Temer sabe que, para aprovar as propostas restantes e entrar para a história como o governo reformista prometido, precisa de todo o suporte possível. “O presidente sempre negocia o que é de consenso com o Congresso. Não é igual à ex-presidente Dilma”, afirma uma fonte palaciana. Apesar disso, integrantes do PMDB na Câmara repudiam completamente a hipótese de perder o protagonismo do comando do país.
Já a oposição insiste no fatiamento da denúncia. Na manhã de ontem, o PCdoB entrou com um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para pedir a separação da denúncia em quatro: uma contra Temer por obstrução de Justiça e uma para cada um (Temer, Padilha e Moreira) por organização criminosa. Desde que a denúncia foi enviada pelo STF, a oposição e integrantes de partidos do Centrão defendem a separação da peça, mas tanto o presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), quanto Rodrigo Maia rejeitaram os pedidos. “São três pessoas físicas e crimes diferentes. Separar é o mais correto a se fazer juridicamente. Não dá para analisar denúncias individuais em pacote”, afirma a líder do PCdoB, Alice Portugal (BA).
Contagem de votos
A votação da denúncia contra o presidente Michel Temer está marcada para amanhã, às 9h. Confira como será o trâmite em plenário:
Hoje
» A segunda secretária da Câmara, deputada Mariana Carvalho (PSDB-RO), lerá o parecer do deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG), aprovado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara (CCJ), que recomenda o arquivamento da denúncia. Os acusados serão notificados.
Amanhã
» A sessão está marcada para começar às 9h e só poderá ser aberta mediante quórum de 51 deputados.
» O relator, Bonifácio de Andrada, terá 25 minutos para ler o parecer. Cada defensor conta com o mesmo tempo para apresentar a defesa, que começa com o advogado do presidente Michel Temer, depois o do ministro Eliseu Padilha e, por último, o do ministro Moreira Franco.
» Na sequência, iniciam-se os debates. Cada orador inscrito terá cinco minutos para falar, alternando-se contrários e favoráveis ao parecer. Após quatro oradores, um requerimento de encerramento da discussão pode ser apresentado, mas só será apreciado pelo plenário caso haja 257 deputados
com presença registrada.
» Encerrada a discussão, começa a votação. São necessárias 342 presenças em plenário (dois terços dos 513). Dois oradores de cada lado terão cinco minutos para encaminhar os votos.
» Cada líder terá 1 minuto para orientar a bancada, e o parecer será respondido nominalmente por todos os deputados no microfone. “Sim” é para que a denúncia seja suspensa. “Não” é para que ela tenha seguimento.
» Os parlamentares serão chamados por ordem alfabética, por estado, alternadamente, do Norte para o Sul. Após a convocação de todos de um estado, o presidente repetirá o nome dos ausentes.
» Se a oposição não conseguir 342 votos “não”, a denúncia é suspensa até que Michel Temer deixe o cargo de presidente da República.
» Caso consiga o apoio de dois terços dos deputados, o STF fica autorizado a instaurar um processo e o presidente é afastado por 180 dias.
» Na primeira denúncia, por corrupção passiva, Temer contou com o apoio de 263 votos contra 227 (e duas abstenções).
Redação
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