Muitos foram surpreendidos – mormente os cidadãos alheios ao mundo jurídico — com a reviravolta no julgamento do famoso “processo do mensalão” no Supremo Tribunal Federal, o qual, na discutível sede de ‘embargos infringentes’ sequer admitida pelo relator, ministro Joaquim Barbosa, como presentes e válidos no âmbito da Corte, absolveu grande parte dos até então condenados por crime de bando ou quadrilha (CP.. art. 288).
Acredito que as pessoas com algum conhecimento de “direito”, do momento político em que vivemos e da influência exercida sobre o Judiciário brasileiro pelo partido político dominante – o PT, já esperavam por tal resultado. Nosso sistema, é preciso entender, é propício para que o Judiciário sofra indevida influência do Poder Executivo, essa é a verdade.
Acho que se reeleita, a presidente Dilma Rousseuf, junto com o seu antecessor, Lula, terá nomeado todos os 11 (onze) ministros do STF e assim, forçoso concluir, mais para o mal do que para o bem, que sua influência sobre a cúpula do Judiciário brasileiro será enorme e sem precedentes na historia democrática do país, digo democrática, porque dela excluo a era Vargas.
Joaquim Barbosa, descreveu tal influência na ação penal que desembocou na absolvição, como decorrência de uma “maioria circunstancial” pelo fato ter sido alcançada com a presença de dois novos ministros, Teori Zavaski e Roberto Barroso, indicados à Corte por Dilma Roussef. Essa sua afirmação decorre do fato de ambos terem demonstrado antes da escolha e posse no STF que divergiam da condenação dos réus pelo crime de quadrilha.
Como sabem meus leitores, ‘ex vi’ da formação profissional, tenho algum conhecimento jurídico e desde muito cedo apreendi que ao contrário das ciências exatas, o direito é a ciência do “deve ser” e, sendo assim, há argumentos que se podem afigurar sólidos e prevalentes, como no caso em comento, tanto no sentido da absolvição como da condenação por crime de bando ou quadrilha.
Neste reduzido espaço, descabe aprofundamento sobre os mesmos. No entanto, alinho-me à corrente de Joaquim Barbosa, tanto com base nos válidos argumentos jurídicos por ele colacionados no seu profícuo voto (assim é chamada decisão de ministro e desembargador) que deu origem ao acórdão (decisão de tribunal) reformado, como também da realidade brasileira no que tange ao tratamento dos cidadãos diante da lei, cujo peso recai quase sempre sobre os menos favorecidos.
Joaquim Barbosa, como todos nós, tem defeitos, mas ele soube aplicar a justiça de acordo com a prova dos autos, prova essa que certificava que houve conluio, conserto de vontades dirigida a um resultado e que para alcançá-lo, se praticou crimes de forma continuada, típica de bando ou quadrilha. Fossem os réus, cidadãos comuns ou não dirigentes do partido dominante, a condenação jamais teria sido revista ou desfeita, essa é a verdade, caros leitores e leitoras.
No ambiente de uma Corte de Justiça, de um Tribunal, é normal que haja divergências, mas não podemos esquecer o ensinamento do grande jurista Enrico Tulio Liebmann no sentido de que “a decisão errônea, e não a decisão divergente, é que se deve fulminar”.
O que os novos Ministros do STF nomeados pela presidente Dilma fulminaram, no meu modesto entendimento e ao sentir de muita gente melhor capacitada, não foi uma decisão errônea. A frustração do povo – sempre sedento de Justiça — pode deslustrar suas biografias como parece ser a tendência já desenhada na opinião pública. Se isso se confirmar, o preço histórico para eles terá sido muito alto.
Como se sabe, a nossa primeira Constituição republicana de 1891 inspirou-se no modelo norte-americano quanto à adoção e forma de escolha dos membros do Supremo Tribunal Federal (lá chamada de Suprema Corte), sendo os Ministros escolhidos pelo presidente da república, os quais, após aprovados pelo Senado (aqui, ao contrário dos EE.UU, nunca nenhum foi recusado) exercem o cargo de forma vitalícia até completarem 70 anos e isso, em alguns casos, como o do ministro Dias Toffolli, significa quase 30 anos. É muito tempo. Tempo demais.
Urge que se adote, como, aliás, defende o ministro Barbosa, um mandato judicial mais curto, de, no máximo, dependendo da idade do indicado, 11 (onze) anos ou até que complete 70 anos. Ao nosso sistema de justiça — a prática atual tem comprovado isso –, não é salutar o exercício dos cargos de ministro do STF, do STJ, TST, STM e mesmo de Desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e Tribunais Regionais Federais, com duração tão longa.
Concluo a contrário senso do ministro Roberto Barroso que o julgamento do mensalão foi realmente “um ponto fora da curva”, não por falta de perícia do ministro-relator, Joaquim Barbosa ou mesmo competência do tribunal, mas porque no Brasil, a regra, para os poderosos de plantão é a impunidade, isso com raríssimas exceções.
Só mesmo o voluntarismo e o sentimento de justiça de alguém que veio de baixo, como Barbosa, poderia fazer a curva sem capotar o veículo ou descarrilhar o trem. Sua missão no Judiciário está cumprida, com louvor.