No livro “Censura por toda parte”, o constitucionalista André Marsiglia descreve sua experiência como primeiro advogado a atuar no Inquérito das Fake News do STF. Em 2019, o STF proibiu a revista Crusoé de divulgar uma matéria sobre Toffoli, “O amigo do amigo de meu pai”, e abriu o inquérito sigiloso das fake news. É possível acomodar censura dentro de uma democracia. Esse inquérito do STF é um exemplo.
Toffoli abriu o inquérito de ofício por meio de interpretação extensiva do regimento interno do STF e designou Moraes como relator ferindo o princípio do juiz natural. “Em defesa da democracia”, liberdade de expressão, imunidade parlamentar e as redes sociais se tornaram alvo. Hoje, já existem mais oito inquéritos sigilosos derivados do inquérito das fake news em que os ministros são vítimas, investigados e julgadores.
No inquérido das fake news, Toffoli enviou um “zap” para Moraes pedindo “apuração das mentiras” da revista Crusoé que mostrava que Marcelo Odebrecht perguntava de um dos funcionários se havia fechado com “o amigo do amigo de meu pai”, que seria Toffoli. Moraes atendeu o pedido de Toffoli e censurou a publicação.
Em violação à Súmula Vinculante nº 14 do próprio STF, os ministros não deram acesso aos autos. Intimado a prestar depoimento à Polícia Federal, o representante da revista perguntou ao delegado: “qual é o objeto da investigação?”. O delegado disse: “eu também não tive acesso aos autos”. Em um processo kafkiano, um não sabia o que perguntar, e o outro não sabia o que responder.
A PGR pediu arquivamento do inquérito. Moraes negou. Sob forte pressão, inclusive internacional, o ministro Celso de Mello soltou uma nota: “a censura… mesmo aquela ordenada pelo Poder Judiciário, mostra-se prática ilegítima, autocrática e essencialmente incompatível com o regime de liberdades fundamentais”.
O STF revogou a censura sobre a reportagem. Mas não reconheceu seu erro e, a partir de 2019, acomodou a prática de censura ao regime democrático, em que há troca de cargos legislativo e executivo. O inquérito se expandiu e deu surgimento a outros, sob sigilo. O livro de Marsiglia parece uma distopia, mas, infelizmente, não é!
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