Há relatos de que Rui Barbosa, certa vez, ao perder uma causa no Supremo Tribunal Federal, teria dito a célebre frase: “O Supremo tem o direito de errar por último”. Com todo respeito, é o que parece ter ocorrido no julgamento da constitucionalidade de alguns aspectos da Lei da Ficha Limpa (LC n. 135/2010), objeto das ADC’s 29 e 30 e ADI 4578.
Longe de assumir posição de censor da Corte Colenda, quem sou eu para tanto(?!), mas, como cidadão, no sagrado direito de livre manifestação do pensamento e com algum conhecimento de direito, posso, sim, expressar opinião pessoal e jurídica sobre a vexata quaestio que arregimentou a atenção do país.
Estou convencido – já o disse – que o nobre desiderato da lei, suplantou, desde sua errônea aplicação às eleições de 2010 pela Justiça Eleitoral, a ratio constitutionalis que a subordina – e a qualquer lei – a dois primados básicos da Magna Carta: a proibição de retroatividade de seus efeitos para limitar ou excluir o exercício de direito modificando situação/condição já definida na lei então vigente e o respeito à presunção de inocência.
Observe-se que, em matéria eleitoral, essas duas garantias inscritas no rol dos direitos fundamentais do art. 5º da Constituição Federal (incs. XL e LVII), foram afastadas pelo Supremo, embora nem o constituinte derivado possa fazê-lo através de emenda constitucional (art. 60, par. 4º).
Posso – com certa repulsa – é verdade, transigir com o princípio da não-culpabilidade para antecipar, no tempo, os efeitos de condenação que limite o exercício de direitos políticos, mas, à luz da Constituição, é inegociável flexibilizar o princípio da irretroatividade de modo que lei nova alcance situações consolidadas sob o império de lei anterior.
Não discuto a necessidade da lei para depurar os costumes políticos da nação. Ao contrário, para tanto, ela é muito bem vinda. Entretanto, os dois princípios antes citados constituem importantes pilares do Estado Democrático de Direito e foram concebidos a partir da Revolução Francesa de 1789 como direitos fundamentais dos cidadãos.
São, assim, conquistas civilizatórias que visam proteger a todos contra a opressão do estado e a insegurança jurídica, para que não possa, a qualquer hora, dispor, utilizando a lei, sobre situações ou fatos do passado, de novo valorando-lhes e atribuindo-lhes efeitos já exauridos no tempo de acordo com a legislação que os regulou.
Data vênia, isso é muito perigoso.
Por outro lado, não se pode olvidar que o Brasil é signatário de acordos e tratados internacionais onde se comprometeu a respeitar os direitos aqui enfocados, o que pode levá-lo, em tese, a ser acusado de violação dos pactos perante Cortes Internacionais, cujas decisões, também prometeu observar.
Sob o ponto de vista jurídico, à luz da nossa Constituição, filiou-me à corrente minoritária da Corte Suprema integrada pelos eminentes ministros:
(i) Celso de Mello, decano do STF e profundo conhecedor do direito constitucional, para quem: “(…) O Congresso Nacional pode muito, mas ele não pode tudo”, tais como “aplicação retroativa da lei a situações jurídicas constituídas sob império de lei anterior e a possibilidade de que decisão ainda passível de recurso possa gerar hipótese de inelegibilidade”.
Destacou, com base em estatísticas do próprio Supremo, “(…) a fragilidade das decisões recorríveis que encerram apenas juízo provisório de culpabilidade porque sujeitas à condição resolutiva”, censurando o que denominou de “juízo apressado de culpabilidade que o legislador consagrou à Lei da Ficha Limpa”.
(ii) Gilmar Mendes, outro emérito constitucionalista, asseverou “(…) não caber à Corte relativizar conceitos constitucionais para atender apelos populares por mais legítimos que sejam. Apesar do forte simbolismo da Lei da Ficha Limpa, a missão do Supremo é interpretar a Constituição, mesmo contra a opinião majoritária”;
(iii) Cezar Peluso, que se despede compulsoriamente neste mês do Tribunal, aduziu: “(…) A LC 135/2010 não pode alcançar fatos ocorridos antes de sua vigência, pois aí a norma deixa de ser geral e passa a ser confisco da cidadania, devendo ainda ser respeitada a presunção de inocência até sobrevenha juízo de culpabilidade definitivo”;
(iv) Dias Toffoli, que condenou diversos pontos da lei com base nos conceitos antes enfocados pelos ministros, filiando-se à corrente minoritária, pois, segundo ele, “(…) é inconstitucional a incidência de causa de inelegibilidade antes do trânsito em julgado da sentença que a acolheu por ferir a regra da presunção de inocência”, também não admitindo os efeitos ‘ex tunc’ daquelas normas.
(v) Marco Aurélio, que embora tenha admitido a eficácia plena da lei, não validou sua aplicação retroativa por atentar contra a segurança jurídica, admitindo que o ‘conserto’ do Brasil com base na lei deve ser feito de forma prospectiva, isto é, para o futuro e não alcançando fatos do passado.
Caros leitores e leitoras, é preciso entender, como advertiram os ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello que não é prudente e aceitável relativizar dogmas constitucionais que integram o alicerce de valores sobre o qual está erigida a Constituição. Que me perdoe, com todo respeito, quem pensa diferentemente.
A insegurança jurídica é fenômeno deveras frequente nos países onde o respeito à Constituição inexiste e os direitos civis e políticos dos cidadãos são desrespeitados e até ignorados. Neles, não há Estado de Direito, sendo o país conduzido de forma autoritária por líderes ou colegiados dirigentes que não os respeitam e mesmo proíbem minorias de dissentir do governo.
O Brasil, também já experimentou elevado nível de insegurança jurídica durante as ditaduras Vargas e Militar.
Em nome de “falsas maiorias”, quase sempre formadas na base do medo e do desestímulo à participação popular nas discussões de matérias de interesse da sociedade e no encaminhamento de soluções, editam-se leis de “salvação nacional” que permitem a perpetuação do poder nas mãos de ditadores e/ou de poucos ao custo do sacrifício da liberdade do povo.
Visualizo muitos benefícios, a prazo médio e longo, no ‘emprego depurado’ da Lei da Ficha Limpa, pena de observarmos deturpações escandalosas.
A depuração deve ocorrer no âmbito do próprio Judiciário, já que há muitas brechas por onde podem transitar injustiças, para, por exemplo, obter-se condenações que eliminem adversários da disputa política e assim facilitar a eleição e, principalmente, a reeleição dos beneficiados.
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