Neste 08 de março, “Dia Internacional da Mulher”, nosso olhar volta-se não só às conquistas, mas, principalmente, para os desafios que ainda exigem das mulheres efetiva união de forças por adoção de políticas públicas visando eliminar a desigualdade no gozo de direitos sociais e legais e, também, a violência que as vitimam e fortalecer a luta pela conquista de cargos político-eletivos.
De início, impõe destacar a existência de uma situação comum a homens e mulheres: a miséria extrema que igualmente os atingem, a qual, nas palavras da presidente Dilma Rousseff, “é compromisso de seu governo erradicar”.
Nesse imenso bolsão de pobreza se aloja a mais cruel das discriminações humanas que é a própria negação do exercício regular da cidadania: a fome que acomete as mulheres de baixa renda ou sem renda alguma, negros, índios, idosos e jovens.
O regime militar que vigeu no Brasil por quase 20 anos, produziu o que à época ficou conhecido na propaganda oficial ufanista como o “milagre econômico”, período em que o país experimentou altas taxas de crescimento, mas também um processo de concentração de renda particularmente perverso para as camadas mais pobres da população que ainda tiveram que pagar a conta do endividamento externo desenfreado sob a forma de inflação.
Com a redemocratização e a estabilidade econômica (Plano Real), foi possível superar a indiferença governamental mediante a adoção de políticas públicas inclusivas e compensatórias de combate a pobreza e as desigualdades, iniciadas no governo Fernando Henrique Cardoso e expandidas pelo ex-presidente Lula, que contou com uma conjuntura econômica mais favorável em relação a de anos anteriores.
Pari e passu com esse processo, sobreveio uma série de diagnósticos que demonstraram a vexatória situação de desigualdade, violência e discriminação a que estavam as brasileiras submetidas e a urgência de operacionalização de políticas públicas nos três níveis de governo voltadas ao combate do vergonhoso opróbrio social.
Como ensinou o grande Rui Barbosa, “a essência da igualdade reside em não tratar igualmente os desiguais”. Em seu socorro, mister ações e programas que os alcancem, como exigência democrática à eliminação dos males que enfraquecem a nação.
A modernidade do país projetou o fenômeno da participação feminina para fora do tradicional trabalho doméstico alcançando tarefas antes exclusivas ou de regra legadas aos homens. No segmento público, um grande número de empregos e funções passou a ser ocupado por mulheres e também uns poucos cargos político-eletivos pelo país afora, enquanto já é considerável o contingente de magistradas, procuradoras e advogadas.
Desse período, destacam-se as lutas sociais na esfera trabalhista buscando o salário igual por trabalho igual; da jornada diferenciada para as mulheres; do combate ao desemprego maior feminino; do direito a programas de saúde para mulheres; da reserva legal de 30% para candidaturas femininas a cargos eletivos nos partidos políticos e mais recentemente da agora bem conhecida Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/06) que penalizou com mais rigor a violência doméstica e familiar contra as mulheres.
Os crimes capitulados nessa Lei, sob a legislação anterior, i. é., o Código Penal, antes das modificações por ela introduzidas, eram fadados a invisibilidade e consequente impunidade.
Foi necessário que a lei os enfrentasse – como já tinham feito outros países – como ações violadoras dos direitos humanos, assim entendidos a partir da “Conferência das Nações Unidas sobre Direitos Humanos”, realizada na cidade de Viena, Áustria, em 1993.
Já no ano seguinte, a “Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher”, ratificou o entendimento de ser tais delitos formas de violação expressa dos direitos humanos e comprometeu os Estados signatários à adoção de legislação específica, tendo sido a Convenção promulgada através do Decreto Presidencial nº 1.973/1996.
Entretanto, somente quase 10 (dez) anos depois, o Brasil cumpriu sua obrigação internacional e interna para com as mulheres brasileiras vítimas de violência praticadas em âmbito familiar e afetivo, editando a Lei nº 11.340/2006.
Sem embargo dos avanços, forçoso reconhecer que muito ainda precisa ser feito na construção de uma nacionalidade em que a cidadania se realize plenamente em relação a todas as mulheres que sofrem discriminação, enfrentam sistêmica desigualdade e continuam vítimas de toda a sorte de abusos e agressões, que chegam a mutilações e morte.
Por isso, é preocupante o quadro que retrata a violência contra as mulheres: só no corrente ano, até ontem, cerca de 25 mulheres já tinham sido assassinadas na Paraíba.
Os dados de âmbito nacional demonstram que a violência tem sido usada como verdadeiro método de tortura física e psicológica, vez que 57,7% das vítimas foram agredidas diariamente e 68,3% sofreram crimes de lesão corporal leve e de ameaça. A maior parte tem idade entre 20 e 49 anos, é casada e cursou o ensino médio, sendo que 84,7% declaram ter filhos e que 67% deles presenciaram a violência contra as mães.
Em âmbito local, também é preocupante a prostituição de adolescentes turbinada pela miséria das famílias e insensibilidade dos sórdidos exploradores que atendem a nefasta clientela ávida por sexo com menores, como também o é a escalada ano a ano dos estupros.
Dados do “Centro Oito de Março” registram aumento de mais de 50% nos estupros entre os anos de 2009, que teve 56 casos e 2010, com 130, isso sem contar o grande número de ocorrências que não chegam à mídia e nem às Delegacias especializadas.
Enquanto povos de cultura feminina mais adiantada, a exemplo dos países nórdicos e alguns europeus, e na América, EE.UU e Canadá, onde as mulheres buscam a igualdade jurídica e até de representação política-parlamentar, entre nós, os espaços institucionais ainda são majoritariamente ocupados por homens, embora a opinião pública já aceite uma participação maior das mulheres na política e demais espaços de poder e, tanto é, que o ano de 2010 foi marcado pelo ineditismo da ascensão de uma mulher ao mais alto cargo da nação.
Passados 80 anos da conquista do direito de voto pelas mulheres, a representação política feminina no Congresso Nacional ainda é muito baixa: das 81 cadeiras do Senado, apenas 12 são ocupadas por mulheres, enquanto na Câmara dos Deputados, há 45 deputadas ou 8,77% do total de 513 parlamentares. Já no governo federal, 10 mulheres chefiam Ministérios, o que é um recorde histórico.
Em âmbito local, o Estado conta com 06 deputadas na Assembléia Legislativa e apenas 01 mulher na Câmara Federal do total de 12 representantes, enquanto há um reduzido número de prefeitas e vereadoras; já no governo há mulheres Secretárias de Estado e em outros cargos importantes, merecendo ainda registro as prováveis candidaturas femininas às Prefeituras de João Pessoa e Campina Grande.
Tais números revelam que a caminhada mirando a igualdade de representação político-partidária e conquista de cargos eletivo-executivos é lenta e longa, mas não admite desânimo e desesperança. O que mais importa, é o levante da consciência feminina no sentido de participar e conquistar os espaços da vida pública em pé de igualdade com os homens, pois constituem mais de 50% da população do país.
Observando a simetria com a estrutura federal, o governador Ricardo Coutinho criou a Secretaria da Mulher e da Diversidade Humana, que veio preencher uma lacuna institucional no Estado com a tarefa de absorver e aplicar os “Planos Nacionais de Políticas Públicas para as Mulheres” visando aplacar e eliminar as diferenças sociais e a vergonhosa violência que atinge as mulheres brasileiras e as minorias éticas e de gênero, igualmente submetidas às mesmas mazelas.
Há renovada esperança, mas é preciso lutar cada dia mais e mais. Como pregou o jurista alemão Rudolf von Iering em obra clássica, A Luta pelo Direito: “Só lutando é possível alcançar o direito”.
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